Escândalo Nacional
Correio Braziliense


É um escândalo nacional: não que alguém, com a cabeça no lugar, possa achar que as empresas devam trabalhar sem lucro, muito pelo contrário. O lucro é o próprio motor da economia de mercado, em que o capitalismo rege as relações de produção. Mas, convenhamos, já estão exagerando. Os dois maiores bancos brasileiros publicaram seus balanços trimestrais e demonstraram lucros acima de R$ 4.000.000.000,00 (é esse monte de zeros mesmo, quatro bilhões de reais) durante os primeiros nove meses do ano. Como diria minha tia Ana, é fácil ter lucros imensos quando remuneramos o investidor com 1% ao mês e cobramos 12% ao mês pelo dinheiro que emprestamos.
               Mas não é só. Os bancos esvaziaram suas agências. Mesmo os privilegiados que ostentam saldos razoáveis e cheque especial batalham para ser atendidos. O “baixo clero”, então, amarga filas imensas quando é constrangido a freqüentar uma sucursal. A internet, teoricamente uma facilitadora, nos transformou a todos em funcionários do banco, realizadores de funções que antes cabiam aos bancários, com a diferença que, em vez de haurir salários, pagamos por operação efetuada. Somos tarifados quando emitimos um cheque muito baixo, somos tarifados quando emitimos um cheque muito alto. Há uma tarifa para pouca movimentação da conta e outra para muita movimentação. Talão de cheque tem tarifa, uso de cartão também. Por outro lado, os poucos funcionários restantes trabalham brutalmente; para complementar o seu salário transformaram-se em camelôs, insistentes vendedores de seguros, fundos e até jogos de azar disfarçados em “poupanças premiadas”.
O fato é que bancos e banqueiros são superprotegidos em nosso país. “Banco não pode quebrar, senão acaba com a economia” dizem as sábias equipeconômicas de plantão (os governos mudam, a mentalidade fica). Se o banco quebrar, azar dos depositantes, os pequenos, é claro, pois os figurões (como antigos presidentes) são avisados, providencialmente, alguns dias antes (por um passarinho?) e transferem a grana para um estabelecimento mais sólido. Os banqueiros falidos, graças a Deus e à nossa benevolente justiça de classe (aquela que tem dó de ladrões ricos e notórios, quando eles são engaiolados com suas doces crias) continuam ricos, apenas um pouco menos. Como se diz, o segundo melhor negócio do Brasil é ter um banco mal administrado. O melhor, evidentemente, é o bem administrado. E ainda dizem que empreender é correr riscos...
Há mais: parte dos impostos dos bancos são abatidos para que eles criem a sua própria entidade “cultural”, que tem por função fazer propaganda institucional de sua marca com o dinheiro de todos nós. É a farra do boi!
Embora necessários, bancos são muito menos importantes do que se crêem. Alguém, por acaso, se lembra do nome dos banqueiros, donos do poder na Itália renascentista? Poucos, não é? E quem não se lembra de Leonardo da Vinci, Miguelângelo, Boticelli e tantos outros maravilhosos artistas, cujas obras nos encantam até hoje? Mozart e Beethoven tiveram que lutar pelo pão de cada dia, mas suas músicas nos emocionam até hoje. Não se pode dizer o mesmo dos banqueiros que financiaram Napoleão, ou Hitler.
A sociedade precisa fazer um esforço sério no sentido de valorizar os que produzem, sejam os bens materiais, sejam os bens imateriais, a cultura. Lucros astronômicos ostentados pelos bancos são um soco no estômago de toda a sociedade, principalmente da enorme parcela a quem se solicita paciência e entusiasmo pelo país, em troca de oferta maciça de desemprego, fala insossa e corrupção.
Ligações espúrias, ou pelo menos muito suspeitas, entre políticos e os detentores do poder econômico merecem uma explicação mais bem elaborada. Se eu mesmo, que tenho acesso à mídia, não consigo ser atendido pelo vereador que ajudei a eleger com o meu voto, é de se imaginar o descaso a que a população mais modesta é relegada.
Este país tem que mudar. E os lucros obscenos obtidos por parte dos bancos precisam ser encarados com seriedade.