De vez em quando a pergunta que não quer calar volta a
afligir todos os brasileiros: afinal, o Brasil tem jeito? Será que o país
poderá se tornar aquela nação com que sonhamos ou estamos fadados, nós e nossos
descendentes até a enésima geração, a viver em um Brasil pobre, povoado por analfabetos
funcionais, governado por gente incompetente e/ou corrupta? Um país onde a maioria
da população não tem residência decente, apenas sobrevive temporariamente em encostas sujeitas a
desmoronamentos, margens de esgotos contaminados e vales aguardando o próximo rompimento de barragens. Em que, para superar a defasagem
educacional dos estudantes das escolas públicas, o ministro de Educação acha que o importante é cantar o Hino Nacional e filmar as crianças entoando
slogans de campanha política. Em que políticos de diferentes cores e ideologias
mostram um descompromisso olímpico para com os eleitores, enquanto resolvem os
problemas econômicos de toda sua família graças a mordomias, caixa dois e
outros recursos ainda em voga. Em que a justiça tarda e falha. Em
que sequer os campeonatos de futebol, que já foram atraentes, conseguem atrair
o interesse das novas gerações, que só portam camisas de clubes europeus.
Claro que há conquistas e façanhas: por aqui os jovens universitários
já estão concluindo um curso de quatro anos sem ter lido um único livro
inteiro! Médicos conseguem receitar remédios e solicitar exames sem examinar o paciente! Mais de 500 mulheres são
espancadas por hora em Pindorama! Vamos votar uma aposentadoria a partir de 65
anos tanto para os que começaram no batente aos 14 anos (ou antes)
quanto para o filhinho de papai que só entra no mercado de trabalho aos 30. Criamos um novo esporte nacional, o
de agredir professores, até em plena sala de aula. E, se não bastasse, somos os
campeões mundiais em ameaçar jornalistas e intelectuais que escrevem algo que supomos ser contrário às nossas convicções.
Está realmente difícil. Temos planos de reformas em todas as
áreas, algumas até importantes, mas deixamos de lado o essencial. Todos sabemos que para melhorar o nível educacional e
técnico de nossa população, aumentar a produtividade, injetar esperança no
horizonte dos marginalizados, diminuir a violência, superar a defasagem de
minorias como negros, mulheres e índios temos que propiciar igualdade de oportunidades. E isso, já o
provaram muitos países, só se consegue oferecendo educação
pública universal de qualidade. Insisto: a igualdade de oportunidades diminuirá
a distância hoje existente entre ricos e pobres,
entre brancos e negros. Tudo bem que se amenize isso com bolsas família, tudo bem que se quebre o galho
supervalorizando as notas de vestibular dos que fizeram escola pública. Mas
são soluções passageiras, provisórias, que não têm como resolver o problema da
desigualdade social. E qual a solução que vem do Ministério de Educação? Vamos
cantar o Hino Nacional e filmar as crianças... Pelo amor...
Sei que o ministro fez um mea
culpa em bom portunhol, mas ele e seus críticos estão se
preocupando com uma questão menor. O problema é que, pelo visto, não há um projeto político no sentido de instituir um ensino de primeira
qualidade nas escolas públicas. Isso se consegue formando bons professores, mantendo-os
atualizados pedagogicamente, dando aos mestres boas condições de trabalho e exigindo deles a contrapartida.
Está na hora de estabelecer uma simbiose entre a
universidade brasileira e o ensino fundamental. Não se admite mais que a sala
de aula, o chão de fábrica do ensino, não seja atualizada, moderna, dotada do
que há de mais inovador e estabelecido pelos teóricos do ensino. Se isso ocorre
no agronegócio, se ocorre na área industrial, na administração moderna, pode e
deve ocorrer também no ensino. O governo não pode voltar as costas para a Universidade, e esta tem o dever de
dialogar com os professores do ensino fundamental e médio. Temos, no país, educadores brilhantes e comprometidos com coisas
sérias (ocorrem-me nomes como o de Magda Soares, da UFMG, e tantos outros) que poderiam colaborar em uma
revolução no ensino, algo que poderia marcar este governo com letras de ouro na
história do Brasil. Vamos ser sérios. O Brasil ainda tem
jeito. Mas a História não para e estamos ficando para trás.
O ensino público universal de qualidade é a chave da nossa redenção.