Doze filmes históricos. E cinema dos bons.
Correio Braziliense


Confundir narrativa histórica e ficcional é muito freqüente. Não por acaso muita gente ainda acha as novelas que antecedem e sucedem o Jornal Nacional parte integrante do noticiário. Com a moda dos romances históricos, onde a invenção é livre, a confusão chega à classe média, convencida de que Down Brown revelou segredos até então sonegados sobre uma suposta descendência de Jesus. Bobagem, é claro.
Confusões não nos devem fazer esquecer a importância de obras de ficção para o conhecimento histórico. Machado de Assis, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa nos ajudam a desvendar aspectos da sociedade brasileira. Balzac, Dostoievski e Philip Roth oferecem painéis reveladores da França, Rússia e Estados Unidos. E há um bom número de filmes realmente imperdíveis para quem quer ir um pouco além dos explosões, da linguagem vulgar, das comedias de humor óbvio e da dicotomia primária “pobres bons contra ricos maus”.
Muita gente me pergunta se filmes podem nos ajudar a compreender a História. Podem. Aqui vai uma lista de 12 deles, dos bons. São filmes históricos no melhor sentido do termo, mesmo que sua intenção inicial não tenha sido essa. Vale a pena assisti-los.
              Como era gostoso o meu francês: Nelson Pereira dos Santos em grande estilo. O encontro de portugueses, franceses e índios, em pleno século XVI, num filme curiosamente falado em tupi, com legendas. Para entender a formação do Brasil.
As bruxas de Salem : belíssimo filme sobre a intolerância oriunda de verdades ditas absolutas e inquestionáveis. Dá conta de aspectos da formação da sociedade americana , fundamentais para entender o comportamento da política interna e externa da era Bush.
Casanova e a Revolução : filme exemplar que conta a História "por dentro", isto é utiliza-se da micro história para narrar a macro história. De resto, é uma obra de mestre, sobre um período fundamental da história do mundo ocidental.
O Grande Ditador: embora pudesse escolher outros filmes “históricos” de Chaplin, como Tempos Modernos (que trata do fordismo) esta é uma obra genial que não pode ficar fora de qualquer lista. Sua imitação de Hitler faz parte de qualquer antologia do cinema.
Queimada: este é o grande filme sobre o colapso do sistema colonial e a hegemonia inglesa. Inteligente, articulado, fantasticamente protagonizado por Marlon Brando, Queimada deveria ser obrigatório para todos os estudantes a partir de 11 anos de idade.
Reds : mais de três horas de duração, três oscars conquistados por este surpreendente filme que narra a revolução russa de outubro de 1917 pela ótica de um jornalista americano. As coisas ficam mais difíceis quando ele resolve levar a revolução socialista para o seu país de origem.
Spartacus (tem que ser o original, de 1960, com Kirk Douglas protagonizando e direção de Stanley Kubrick) : idealização dos escravos romanos, a partir do livro homônimo de Howard Fast. Mesmo assim, raro exemplar de desconstrução da estrutura de poder de Roma e de percepção dos limites da luta política por parte dos escravos.
1900: Epopéia que narra o processo de conscientização de camponeses italianos submetido aos grandes senhores, durante a primeira metade do século XX. Saga feita com a habitual competência de Bertolucci, idealiza os oprimidos, sataniza os ricos, mas é grande cinema e excelente referência histórica.
Uma cidade sem passado: filme eletrizante mostra pesquisa histórica imbricada com o cotidiano dos habitantes de uma pequena cidade alemã depois da II Guerra Mundial. Diferenças entre história e memória, subterfúgios para esconder documentos e criar uma história oficial, tudo se cruza nesse filme alemão extraordinário.
Adeus, Lênin: outro filme alemão extraordinário mostra o fim do socialismo real e seus reflexos numa família cuja matriarca tinha sido uma militante comunista convicta. Cruel, irônico e brilhante.
A lista de Schindler O filme navega entre a narrativa histórica confiável e equilibradas doses de emoção. E, melhor que tudo, dá a dimensão do que aconteceu aos judeus e aos alemães, uns sendo esmagados, outros esmagando, mas ambos perdendo muito de sua dimensão humana.
A última ceia: não confundir com um americano homônimo. Este é do cubano Thomas Gutierrez, de 1978, e lida com a relação entre os senhores brancos e os escravos negros. Trabalha tanto com as relações de poder como com a ideologia engendrada a partir dessa prática e vale para qualquer país onde a escravidão tenha desempenhado um papel importante, como o Brasil.
 
 


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